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As conexões cerebrais entre respiração e estados mentais

Respirar é uma necessidade, todos sabemos. Se paramos de respirar por muito tempo, morremos. Intuitivamente, os seres humanos perceberam que a respiração é mais do que uma simples necessidade biológica. Embora instintiva e automática, podemos exercer controle sobre ela e, ao fazê-lo, conseguimos alterar o nosso estado de espírito. Respire fundo é um conselho frequente em situações de estresse. Para meditadores e iogues, o ato consciente de respirar é parte essencial do processo para alcançar estados espirituais elevados (a palavra “espírito” vem do latim e significa “respiração” ou “sopro”).

A respiração não apenas altera o nosso estado de espírito para melhor; ela também faz o inverso. Por exemplo, pacientes ansiosos, quando em crise, tendem a respirar de maneira rápida e superficial. A aceleração da respiração provoca hiperventilação. A hiperventilação acelera o ritmo cardíaco, causa palpitações, falta de ar, formigamento em partes do corpo e tontura. Pode também causar dor no peito e dificuldade para falar ou andar. Se o indivíduo estiver tendo um ataque de pânico, ele pode pensar que está morrendo ou enlouquecendo.

Para sair desse estado de sofrimento e medo, nossos pacientes ansiosos podem fazer algo simples e inteiramente ao seu alcance: respirar de modo lento e profundo por alguns minutos. Isso passará ao cérebro a mensagem de que está tudo bem e o sistema nervoso se acalmará.

Que a respiração lenta tem um efeito calmante – e, inversamente, que a respiração rápida tem um efeito excitatório – era de conhecimento geral, mas não se sabia exatamente por quê. A maioria dos cientistas presumia que a causa desses efeitos era provavelmente indireta, talvez ligada ao aumento ou diminuição da inalação de oxigênio ou mudanças metabólicas no cérebro.

Um pesquisador em particular, no entanto, começou a se perguntar o que, de fato, controla o ritmo da respiração. Seu nome é Mark Krasnow, Professor de Bioquímica da Universidade de Stanford, um estudioso do pulmão.

Ao começar a pesquisar sobre o assunto, ele encontrou um artigo do neurobiólogo Jack Feldman, publicado em 1991. Feldman identificou em camundongos uma área do tronco cerebral responsável pelo controle da respiração e nomeou essa área de complexo pré-Bötzinger. O complexo pré-Bötzinger é um marca-passo respiratório, que também está presente em humanos.

O aglomerado de neurônios do complexo pré-Bötzinger inicia cada respiração. Com cada pulsação, esses neurônios enviam um sinal, via medula espinhal, para o diafragma e para os pequenos músculos entre as costelas dizendo para se expandirem e enviam outro sinal dizendo para se contraírem.

Mark Krasnow primeiramente se perguntou se todos os neurônios do complexo pré-Bötzinger eram iguais uns aos outros. Por meio de análise genética, um dos integrantes de sua equipe descobriu que há mais de 50 subtipos diferentes de neurônios marca-passo.

A pergunta seguinte foi: por que eles são diferentes e o que fazem de especial?

Para descobrir as funções de cada neurônio marca-passo, eles escolheram subtipos específicos de cada vez e extraíram os neurônios durante experimentos.

Num dos experimentos, após remover um subtipo que abrangia cerca de 200 neurônios, eles perceberam que os camundongos permaneciam vivos e respirando, mas paravam de suspirar.

Em outro experimento, com outro grupo de neurônios, eles removeram cerca de 150 neurônios e perceberam uma mudança no ritmo da expiração, que se tornou mais longa.

Posteriormente, escolheram um outro subtipo, também com cerca de 150 neurônios, extraíram os neurônios e aguardaram para ver o que acontecia. Dessa vez, eles ficaram desapontados. Nada aconteceu. Nada mudou nos padrões da respiração. Alguns dias depois, no entanto, eles se surpreenderam ao notar que o comportamento dos camundongos havia mudado. Os ratinhos pareciam relaxados, muito calmos. Eles passavam o tempo parados num canto, lambendo o pelo tranquilamente – muito diferente do comportamento usual, que consiste em explorar o ambiente e farejar tudo ao redor.

Em busca de uma explicação para essa mudança, os pesquisadores examinaram as conexões desses neurônios e descobriram que eles se conectavam diretamente com o centro de luta ou fuga (fight or flight), que é a área do cérebro que comanda nossas respostas diante de ameaças.

Mark Krasnow explica que, para entender o significado disso, precisamos mencionar o outro marca-passo que nosso corpo possui: o marca-passo cardíaco. O marca-passo respiratório tem duas características que o diferem do marca-passo cardíaco.

A primeira delas é que o marca-passo cardíaco, que dá o ritmo das batidas do coração, está localizado bem no órgão que ele controla. O marca-passo respiratório, que controla a respiração, por sua vez, está longe dos pulmões – ele está localizado no cérebro. E por estar no cérebro, o marca-passo respiratório acabou assumindo mais funções do que a função puramente mecânica de expandir e contrair os pulmões – a respiração passou a se integrar aos centros emocionais e de ansiedade do cérebro. E essas partes do cérebro podem impactar e regular a respiração.

Image by rawpixel.com on Freepik

A segunda característica é que, diferentemente do que ocorre com o marca-passo cardíaco, nós podemos controlar conscientemente o marca-passo respiratório – ao prender, acelerar ou desacelerar a respiração. Ao fazê-lo, estamos exercendo controle sobre a comunicação entre o marca-passo respiratório e os neurônios do centro de luta ou fuga.

Diante dessa descoberta, a conclusão a que chegaram os pesquisadores é que esse grupo de neurônios provavelmente envia atualizações sobre o status do marca-passo respiratório para a região de luta ou fuga para informar: “Está tudo bem aqui”. Quando algo está errado, eles podem avisar: “SOS, SOS, a respiração está desregulada. Precisamos resolver isso e retomar o ritmo normal novamente”. A pesquisa mostra que a comunicação entre o marca-passo respiratório e o centro de luta ou fuga ocorre nos dois sentidos. Ou seja, o centro de luta ou fuga também envia atualizações para o marca-passo respiratório.

Se você ainda não acreditava no poder que a respiração tem para alterar estados mentais e emocionais ou achava que isso era conversa fiada de autoajuda, agora tem uma explicação fundamentada oferecida pela neurociência. Todos temos esse mecanismo natural para regular a ansiedade e o estresse. Só precisamos usá-lo de maneira deliberada.

Clique na imagem e confira!

Fontes de pesquisa:
– RADIOLAB: Breath. Reported and produced by Annie McEwen, Matt Kielty, and Molly Webster. Podcast. Disponível em: https://www.wnycstudios.org/podcasts/radiolab/articles/breath
– DENWORTH, Lydia. The Inside Story of How Slow Breathing Calms You Down. Psychology Today. Disponível em: https://www.psychologytoday.com/us/blog/brain-waves/201704/the-inside-story-how-slow-breathing-calms-you-down.
Artigo do qual Mark Krasnow é o autor sênior:
– YACKLE, Kevin, et al. Breathing control center neurons that promote arousal in mice. Science 355.6332 (2017): 1411-1415. DOI:10.1126/science.aai7984

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